Valdeck Almeida de Jesus
O poeta da verdade!
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10/01/2014 09h30
Felicidade Clandestina ou Brand News from Venezuela

Today was my adventure day. Hoy fue mi día de aventura. Hoje foi meu dia de aventura. Risos. Esta frase em três línguas infantis me lembrou Lulu Dente de Cano. Era uma bichona amiga de um amigo meu. Na verdade, o nome verdadeiro era Luís. Como era biba, traduziram o nome para Lulu, uma forma feminina de se referir a ela, como gostava de ser chamada. Uma vez o meu amigo me chamou para dar uma voltas, sem me dizer aonde iríamos. Paramos embaixo de um prédio de três andares e meu amigo gritou o nome de Luís, que apareceu no parapeito e jogou a chave do portão. Quando chegamos à porta de Lulu, ela se surpreendeu com minha presença e não gostou:



- My dear friend, you know I don’t like surprise... – e fazia umas caras super engraçadas. Repetiu a frase umas quatro vezes, enfezada com meu amigo. E meu amigo repetia:



- Lulu, this is Valdeck, he speaks English. Mas Lulu não ouvia, só repetia a frase à exaustão, até que se deu conta de que eu estava compreendendo aquela curtinha frase em inglês.



Voltando para Meu Quarto de Hotel, hoje, 17.12.2013, acordei sem me preocupar com o que ia fazer durante o dia. Afinal, já havia marcado um encontro com um amigo para o final da tarde. Talvez eu gaste o resto do dia navegando na internet ou dando umas voltas nas ruas próximas ao hotel. Às 8:30h resolvi descer para o desayuno. O elevador durou um século para abrir. Desci pela escada de emergência interna. Antes, abri a outra saída de emergência e confirmei que esta descia por fora do prédio, como eu tinha visto de relance anteontem, quando um casal a abriu e desceu por lá, por conta da demora do elevador. Engraçado como as pessoas andam em casais... Quando olhei pra fora, vi umas construções parecendo favela. Depois do café vou circular escada acima para tirar fotos da favela ao lado do hotel.



Interessante como estou condicionado a agir mecanicamente. Mesmo estando sozinho no quarto e nos corredores do hotel, ajo como se estivesse em multidão, todo certinho. Como é forte a pressão que a civilização mantém sobre nós...



Tentei comer o ovo mexido, mas estava sem sal. Tentei salgá-lo, mas não resultou em nada. Não comi. Tentei comer o feijão preto, igualmente insosso, abandonei tudo no prato. Resolvi dar uma mordida no bolinho de farinha de trigo frito, que eu nomeei Bolinho de Silvinha, intragável. Me contentei com suco de laranja, pão integral, geleia de morango e de melancia, manteiga, café com leite.



Um casal de brasileiros conversa e eu percebo sua nacionalidade pelo som das palavras. Outro casal se senta em frente à minha mesa. O rapaz me olha várias vezes, mas eu não retribuo nem insisto, não quero saber do que se trata. Mais um casal entra no salão, duas senhoras bichonas, que chamam a atenção do rapaz que me observa. Continuo meu café. O casal de brasileiros e o de bichonas ficam no salão, enquanto o rapaz que me olhava e sua namorada saem. Eu saio em seguida. Estão na entrada do elevador, quando a porta se abre eles resolvem ficar no saguão. Eu subo, fazendo caretas para o espelho.



No quarto eu pego a câmera fotográfica e abro a porta de emergência. Tiro algumas fotos e tento voltar. A porta não abre por fora. Resolvo subir uns andares e encontro uma porta aberta, mas sigo andares acima, até o décimo sétimo. A paisagem é linda de cima. O prédio ao lado do hotel é de uma arquitetura bem moderna. Está invadido por sem-teto e há algumas construções de casas sendo erguidas no lugar onde seria a garagem do edifício. Ao fundo, um grande terreno com casas de favela. As montanhas ao longo do horizonte têm edifícios; outras são cobertas de favelas. Ao fundo, florestas montanha acima. Caracas é um labirinto de civilizações, retrato da sociedade moderna, contraditória, em que os humanos se desumanizam por conta da sobrevivência. Ninguém vai se matar, se suicidar em massa. Todos querem viver, e vão viver, custe o que custar. Aprende-se sem forçar, naturalmente, a encontrar saídas, honestas ou foras da lei.



Uma tarde inteira no Facebook, lendo e respondendo mensagens, postagens, cutucadas, curtidas e compartilhadas. Após leitura do texto de Clarice Lispector, postado por Renata Rimet, intitulado “Felicidade Clandestina”, fiz este breve comentário:



Às vezes um charuto é apenas um charuto, disse Sigmund Freud. Eu acho que a felicidade deve ser experimentada aos poucos, como Clarisse fez nessa bela crônica-conto-ou-sei-lá-o-quê, pois felicidade não tem nome, nem rótulo, nem etiqueta, nem sobrenome, nem endereço, nem CPF, nem senha secreta. Está sempre ali, ao nosso lado, enrolada, encoberta, descoberta, na mesa, na cama, na geladeira, no chão do quintal, ou apenas na imaginação. Melhor viver e conviver com ela, mesmo em fantasia, que descobrir que o presente é ausência e decepção.


Publicado por Valdeck Almeida de Jesus
em 10/01/2014 às 09h30