Urbanos, Humanos, Estranhos...
O livro de Maria Prado de Oliveira atiça a curiosidade pela capa de cor abóbora, cortada por uma linha diagonal, próxima da qual um casal parece estar espiando por trás do fio, por trás de uma porta ou fechadura imaginária.
Entre curioso e indignado, também perscruto por trás do fio. E este misto de sensações me acompanha durante a leitura dos “contos e comentários livres”, enquanto tento seguir a autora/narradora nas festas, nos lugares e nas situações descritas no livro. E assim permaneço, durante toda a leitura, como se eu, também, pudesse ver, pelos olhos de Maria Prado, o que ela olha, vigiando o que ela vigia, com o mesmo olhar desconfiado, buscando desvendar os acontecimentos, o dia a dia de advogados, médicos, copeiros, conferencistas, empregados e patrões...
Logo de início ela nos dá a dica de seu olhar, crítico, pautado na observação filosófica, no questionamento aos padrões estabelecidos, no respeito à diversidade. Maria Prado tem seu próprio olhar, mas não aquele olhar comum, de humano comum. A linha de observação dela é a de desestruturar as estruturas, denunciar a hipocrisia e o mundo de aparências, de balançar as autarquias e de propor um novo olhar, uma nova visão, quiçá uma nova atitude do leitor diante do que antes estava pronto e acabado; propor uma revolução no mundo medíocre e pasteurizado, empacotado e vendido pela mídia.
E a mídia, tão aplaudida e bajulada por muitos, é cutucada nas linhas e entrelinhas de “Urbanos, Humanos, Estranhos...”. O politicamente correto, o estabelecido, o conformismo, o viver de aparências, o “sucesso” de estar em todas as revistas, sites, TVs, rádios e jornais, tudo isso é colocado em cheque. O livro é ácido, crítico, questionador, nos faz repensar atitudes, nos reposicionarmos no mundo. E a pergunta é inevitável: o que estou fazendo para tornar o mundo melhor? Até que ponto eu não sou responsável, direta ou indiretamente por tudo que acontece? Sair do conforto, fazer algo de concreto é também filosofar. E este é, em suma, o chamamento que o livro nos faz.