Valdeck Almeida de Jesus
O poeta da verdade!
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Poesia no presídio: Eu vou nas asas de um passarinho

Tomo de empréstimo o verso da música “Beija-Flor”, da Timbalada, para expressar minha visita e participação no recital puxado por Negreiros Souza, poetisa do coletivo Resistência Poética, hoje, dia 24 de novembro de 2015, na ala feminina do Complexo Penitenciário da Mata Escura, no bairro Mata Escura, em Salvador-BA. A leitura e declamação de poesias, oficinas de turbantes e maquiagem, foi parte de uma atividade promovida por vários órgãos do Estado da Bahia, ligados aos Direitos Humanos, ressocialização, Defensoria Pública, Ouvidoria e outros, nesse mês da Consciência Negra.

E eu voei, literalmente, desde a noite de ontem, quando recebi o convite de Negreiros. Fiquei super ansioso, curioso, tenso, pois nunca entrei num presídio, nem tenho experiência em atividades com pessoas privadas de liberdade. Tudo o que sei e sinto é fruto do preconceito, do imaginário popular e das lendas urbanas. Fiquei perguntando tanto detalhes à minha amiga que ela me disse “calma”. Fui logo ao Google procurar informações sobre a localização exata do espaço, e encontrei dois endereços. Isso me deixou mais tenso, pois tenho trauma com o tempo, sempre chego bem antes aos compromissos. Bombardeei outra vez a poeta pedindo detalhes. Finalmente, marcamos encontro na Estrada da Mata Escura, em frente ao complexo.

Vale informar que não dormi direito, acordei bastante cedo e já fui pro telefone ligar pra minha amiga, sem sucesso. A chamada caía na caixa de mensagem. Segui ao local combinado e procurei onde estacionar. Bastante nervoso, andei alguns metros até o ponto de ônibus ao lado do presídio e me sentei ali, à espera de Negreiros Souza, que chegou bem depois do horário que combinamos. Isso só me fez ficar ainda mais ansioso, liguei pra ela várias vezes, imaginei que eu estivesse no local errado, mudei para outro ponto e esperei mais, até que ela desceu de um ônibus, para meu alívio.

Entramos, sem documentos, sem chaves, telefones, sacola, qualquer objeto. A única coisa que levei foi os poemas e um par de óculos. Aos poucos fui me acalmando, vendo que as mulheres ali eram todas de carne e osso, humanas, gente igual à que vejo em oitenta por cento da cidade: negras, pobres, da periferia, talvez muitas delas sem o primeiro grau, sem bens materiais e com famílias destroçadas emocionalmente. Apesar de todas essas confabulações mentais, fui aterrissando, olhando daqui e dali, sentindo o ambiente e me aquietando.

Após as falas oficiais começou a festa de poesias, maquiagem e turbante. As meninas mostraram o verdadeiro lado de seus espíritos, com sorrisos, expressões livres de quaisquer amarras. Algumas se animaram e usaram o microfone para se divertir cantando músicas da Timbalada, Olodum e grupos afros de Salvador. Eu recitei poemas do livro “A poesia cria asas”, do Grupo Ágape, e Negreiros recitou poemas dela, de Giovane Sobrevivente e do Resistência Poética. São essas memórias que libertam, levam qualquer um para destinos onde não há muros, grades, regras ou impedimentos. Tudo era festa e alegria, mas tinha hora pra terminar. As maquiagens e poemas cada uma levou na mente, na pele, nos abraços dados e recebidos. Os turbantes, esses ficaram aguardando o dia da saída final, quando elas vão poder levar pra casa e voltarem a ser crianças encantadas outra vez.

 
Valdeck Almeida de Jesus
Enviado por Valdeck Almeida de Jesus em 24/11/2015
Alterado em 24/11/2015
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