Valdeck Almeida de Jesus
O poeta da verdade!
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O gelo que virou frango

 

Eu tenho uma amiga que mora num bairro chamado Moscou, em Salvador. Sempre apareço na casa dela de surpresa, e ela repete “você vai ficar com fome aqui em casa se vier sem avisar”. E eu sempre prego peças nela, chegando de supetão.

 

Uma das características de minha amiga é o gosto peculiar por coisas diferentes. Come de um tudo, de caramuru a jiboia, de gato do mato a sariguê, de raposa a tatu. Outro dia ela enganou a família e vizinhos com um pato delicioso – ninguém da casa come, ou comia essa iguaria -, dizendo que era galinha caipira. E agora, na iminência da visita de um filho que vem de Angra dos Reis, ela sabendo que eu viajaria ao interior da Bahia para visitar uma amiga em comum, me encomendou outro pato.

 

Viagem marcada e tudo combinado, passei por Vitória da Conquista, Jequié, e parei em Lajedo do Tabocal. O pato já deveria estar duro no congelador. Na véspera de minha ida, minha amiga lembrou que não tinha gelo para conservar o pato na longa trajetória de mais de cinco horas até a capital.

 

Pegou uma sacola plástica, encheu de água, colocou dentro de outra para reforçar e levou ao congelador. Começamos a ouvir um barulho de água derramando, ela achando que era da geladeira e eu achando que pudesse ser a torneira meio aberta da pia. Ela sugeriu que seria um cano sobre a parede dividida com o vizinho. Não verificamos e ficou por isso mesmo. No dia seguinte ela saiu para o trabalho e eu fiquei só aguardando o almoço para prosseguir a jornada. Abri a vasilha térmica, coloquei o “gelo” e um pato e uma pata – eu não citei que era uma família.

 

Dirigi 22km pela rodovia estadual BA-250, atravessei a rodovia federal BR-116, peguei outra federal, a BR-420 por 128 quilômetros até o entroncamento com a federal BR-101. Prossegui 263km até Santo Amaro, deixando a 101 no entroncamento de Muritiba, onde peguei a BA-502 até Cachoeira, pegando a BA-513, e retomando a BR-420 em Santo Amaro, de onde parti para Candeias pela BA-522; de Candeias até o entroncamento da BR-324 mais 22 quilômetros, e dali a Salvador mais 35 quilômetros. Cheguei em casa, coloquei o gelo, o pato e sua companheira no congelador, descansei, almocei e fui levar a iguaria para minha amiga.

 

Ela não estava em casa, mas seu neto sim. Esperei até quatro da tarde. E ela chegou com a frase de sempre. “Espero que esteja morto de fome, pra aprender a avisar que vem”. Eu falei que já estava almoçado e depois de conversas, abraços e novidades, abri a geladeira para lhe entregar o casal de pato. Falei da longa viagem, retirei o ‘saco de gelo’ e em seguida a pata e o pato. Até brinquei: esse pato só tem uma pata.

Ela muito feliz pelo presente falou, “mas eu só pedi pato e você trouxe frango”. Eu falei que não, o terceiro saco era uma pedra de gelo. Ao abrir, verificamos que era um frango congelado. Era o almoço de fim de semana de alguém. Devolver o frango? Comer o frango? Mas a pergunta ficou: quem vai pagar o pato?

Valdeck Almeida de Jesus
Enviado por Valdeck Almeida de Jesus em 03/09/2024
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